sábado, 6 de julho de 2013

Encíclica do Papa Francisco - Luz da Fé

O Papa Francisco, que hoje publicou a sua primeira encíclica, afirma que a relação da fé com o mundo contemporâneo é marcada pela desconfiança e reitera a importância de acreditar num sentido transcendente para a vida.
“Quando o homem pensa que, afastando-se de Deus, se encontrará a si mesmo, a sua existência fracassa”, escreve, no documento intitulado ‘Lumen fidei’ (Luz da fé).
O Papa argentino, que retoma a reflexão do seu predecessor, Bento XVI, assinala que muitos veem na fé um elemento das “sociedades antigas” que não serve para “os novos tempos, para o homem tornado adulto, orgulhoso da sua razão”.
“Nesta perspetiva, a fé aparecia como uma luz ilusória, que impedia o homem de cultivar a ousadia do saber”, observa, ao citar o filósofo alemão Nietzsche (1844-1900), segundo o qual “o crer opor-se-ia ao indagar”.
Assim, indica o Papa, a fé acabou por ser associada à “escuridão” e entendida como um “salto no vazio”, capaz de “aquecer o coração e consolar pessoalmente, mas impossível de ser proposta aos outros como luz objetiva e comum para iluminar o caminho”.
Francisco defende que a fé cristã não é “um refúgio para gente sem coragem” e evoca o poeta norte-americano T. S. Eliot (1888-1965) para evidenciar que “quando a fé esmorece, há o risco de esmorecerem também os fundamentos do viver”.
“Se tiramos a fé em Deus das nossas cidades, enfraquecer-se-á a confiança entre nós, apenas o medo nos manterá unidos, e a estabilidade ficará ameaçada”, avisa.
O Papa afirma que a fé não faz esquecer “os sofrimentos do mundo”, mas oferece a resposta de Deus para “abrir” nestes “uma brecha de luz”.
Francisco destaca o facto de a crença no “amor de Deus criador” levar a um “maior respeito para a natureza”, recusando modelos de progresso que se baseiem apenas “na utilidade e no lucro”.
A reflexão papal sustenta também que o olhar da ciência “tira benefícios da fé”, pois “convida o cientista a permanecer aberto à realidade, em toda a sua riqueza inesgotável”.
O texto passa em revista a história da fé na Bíblia, que passa por Abraão, o povo de Israel e Moisés, entre outros: “A fé é a resposta a uma Palavra que interpela pessoalmente, a um Tu que nos chama pelo nome”.
Segundo Francisco, esta fé, enquanto “memória do futuro”, está intimamente ligada com a esperança.
“A fé supõe que a palavra – uma realidade aparentemente efémera e passageira –, quando é pronunciada pelo Deus fiel, se torna no que de mais seguro e inabalável pode haver”, frisa.
A encíclica evoca a “tentação da incredulidade” e a “idolatria”, que recusam “um convite para se abrir à fonte da luz, respeitando o mistério próprio de um Rosto que pretende revelar-se de forma pessoal e no momento oportuno”.
Neste contexto, aborda-se a impossibilidade de “ver Deus pessoalmente” de que se lamentava o filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), refutando qualquer interferência humana.
“A partir de uma conceção individualista e limitada do conhecimento é impossível compreender o sentido da mediação”, alerta o documento.
O Papa acrescenta, noutra passagem, que os mandamentos não são “um conjunto de preceitos negativos, mas de indicações concretas para sair do deserto do ‘eu’ autorreferencial” e entrar em diálogo com Deus.
OC

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