domingo, 24 de novembro de 2013

O AMIGO NÚMERO 3



1. Trago hoje uma antiga história rabínica, edificante, que se ajusta bem a este tempo de Novembro. Um homem tinha três amigos. Mas tinha-os catalogados por ordem de importância: o amigo n.º 1, o amigo n.º 2 e o amigo n.º 3. O amigo n.º 1 era naturalmente o melhor amigo do nosso homem; digamos que eram amigos íntimos, e, por isso, inseparáveis: andavam sempre juntos. O amigo n.º 2 era aquele amigo que o nosso homem encontrava de vez em quando, apenas de vez em quando, altura em que confraternizavam e punham a conversa em dia. O amigo n.º 3 era aquele género de amigo que o nosso homem encontrava muito raramente, por mero acaso, e de quem já nem sequer se lembrava do nome.

 2. Um dia, o nosso homem foi apanhado de surpresa. Chegou-lhe pelo correio uma carta que provinha do palácio do Rei. O nosso homem abriu a carta, leu, releu, e ficou muito preocupado. Tratava-se de uma intimação que obrigava o nosso homem a comparecer no palácio do Rei. Ora, acontece que o nosso homem, o homem desta história, nem sabia o que era um Rei, e muito menos um palácio. Tão pouco sabia o caminho para o palácio. Mas preocupava-o sobretudo o modo como se devia comportar na presença do Rei. Não era o mundo dele.
 3. Ficou aflito. Já nem conseguia comer nem dormir. Apoderou-se dele uma grande tremedeira. Quando isto nos acontece, lembramo-nos naturalmente de recorrer aos amigos. Foi assim que o nosso homem foi desabafar com o seu melhor amigo, o amigo n.º 1. Expôs-lhe o assunto que o preocupava. Tinha sido intimado a comparecer no palácio do Rei, e tinha muito medo, pois nada percebia de palácios e de reis. Foi assim que pediu ao seu amigo n.º 1 o favor de o acompanhar naquela viagem difícil. Nem era nada demais, dado que andavam sempre juntos, eram amigos inseparáveis. O amigo n.º 1 respondeu assim ao nosso homem: é verdade que somos muito amigos; de facto, andamos sempre juntos. Pede-me o que quiseres, que eu estou sempre disposto a ajudar-te; porém, nessa viagem, não te posso acompanhar.
 4. É assim que o nosso homem, desiludido, tem de ir à procura do seu amigo n.º 2. Pô-lo a par do seu problema, e implorou-lhe, da mesma maneira, que o acompanhasse naquela viagem difícil. O amigo n.º 2 ouviu atentamente a exposição do nosso homem, e respondeu assim: sim, disponho-me a acompanhar-te, mas com uma condição: vou contigo, mas só até à porta do palácio; daí para a frente, terás de ir sozinho, pois não te posso acompanhar. O nosso homem, porém, insistiu: mas o meu problema é dentro do palácio, porque eu não entendo nada de reis e de palácios. Compreendo, retorquiu o amigo n.º 2, mas, nesse caso, não te posso mesmo ajudar. Terás de ir sozinho.
 5. Foi então que o nosso homem se pôs a caminho para ver se encontrava o seu amigo n.º 3, aquele amigo de quem já nem se lembrava do nome nem de quando tinha sido a última vez que se tinham encontrado. Com alguma sorte, lá o encontrou. Expôs-lhe o problema, e suplicou-lhe que o acompanhasse naquela viagem difícil. O amigo n.º 3 ouviu atentamente, e nem sequer deixou o nosso homem terminar. Respondeu logo: mas é claro que te acompanho. Até te digo mais: ficaria mesmo muito triste, se soubesse que estavas a braços com esse problema, e não me tivesses dito nada!
 6. A história rabínica termina aqui. Mas, para entendermos o seu alcance, terei de a descodificar. O nosso homem, o homem desta história, sou eu, és tu, pode ser qualquer um de nós. O Rei é Deus. A viagem é a morte. O amigo n.º 1, aquele que anda sempre connosco, é a nossa própria vida, os nossos projetos, os nossos trabalhos, os nossos sonhos, as nossas ambições. De facto, andamos sempre juntos, somos inseparáveis. Todavia, naquela viagem, os nossos projetos e trabalhos não nos podem acompanhar. O amigo n.º 2, aquele que encontramos de vez em quando para confraternizar e pôr a conversa em dia, são os nossos próprios amigos. Aqueles que se mostram dispostos a ir connosco, mas só até à porta… do cemitério! O amigo n.º 3, aquele que muito raramente encontramos, de quem até acabamos por esquecer o nome, mas que até ficaria triste e sentido se não lhe disséssemos nada, e que é o único que nos pode acompanhar, é o Bem que fazemos, o Amor que pomos naquilo que fazemos.
 7. Bem vistas as coisas, está bom de ver que temos de inverter a ordem dos nossos amigos, e passar para 1.º lugar aquele que temos no catálogo em 3.º lugar. Decisivo, decisivo, decisivo é o Amor. Temos de nos encontrar muito mais vezes com este amigo. Na verdade, diz bem S. Paulo, tudo passa; só o Amor permanece (1 Coríntios 13,8). Fica atento, meu irmão de Novembro.

Por D. António Couto, ©Mesa de Palavras

Bom dia


Papa Francisco


domingo, 17 de novembro de 2013

XXXIII Dom. Comum - C

Viver  a  CONFIANÇA !


Viver a fé cristã nunca foi fácil ou cómodo. Porém, Jesus nunca nos convida a fazer maus investimentos. Por isso, apesar das dificuldades, vale mesmo a pena viver a fé?

1. PERTO DO FIM DO MUNDO:
- “Quando sucederá isto”? Muitas respostas tem havido sobre a data do fim!
- Jesus fala-nos em “ambiente apocalíptico”, sobre o destino do universo e da história! A apocalíptica é um estilo que quer encorajar e ajudar-nos a decidir!
- A destruição do Templo de Jerusalém, no ano 71, seria um sinal do fim!
- A nossa questão sobre o “quando” denota um sentimento de medo: medo sobre o futuro, que chamamos “destino”, medo acerca do que teremos de passar!
- Há lugares no mundo, como em países do Médio Oriente, em que ser cristão é motivo de perseguição e até de morte, fruto do ódio e da falta de liberdade!
- Ao mesmo tempo, nunca como hoje se fala tanto de visões e outras manifestações do divino... - “Não os sigais” – diz o Senhor!

2.MAIS PERTO AINDA DO “NOVO DIA”:
- Diante da confusão dos nossos tempos, com tantas mensagens contraditórias e tantos “messias” improvisados, a Palavra convida-nos a dirigir o nosso olhar para Jesus Cristo Ressuscitado, acolhendo a sua verdade!
- “Não vos alarmeis” – pois nada há na terra que seja definitivo. Definitivo é só o Reino de Deus; definitiva é apenas a vida nova que Jesus nos vem oferecer!
-       Ao Povo de Israel, que no séc. V a.C. vivia no pessimismo e apatia,  aos cristãos de Tessalónica, que não trabalhavam pois o fim estava perto,  e a nós hoje, Deus diz bem alto: “Há-de vir o Dia do Senhor”. Da luz desse dia, brotará a esperança para construirmos um mundo segundo o desígnio de Deus.
-       Essa confiança no “Dia do Senhor”, na chamada “Parusia” ou Segunda Vinda de Cristo, dá-nos força para enfrentar dificuldades e perseguições. Sabemos que o amor de Deus nos acompanha e o seu Espírito de fortaleza nos ilumina... A espiritualidade do cristão é de “transfiguração do mundo e de esperança na vinda do Reino de Deus” (João Paulo II, Creo en la vida eterna, 169).

3.SABER ESPERAR:
- É por sabermos que o amor de Deus, manifestado em Jesus e alimentado constantemente pelo Espírito Santo, nunca nos abandona, que podemos confiar!
- Ser padre hoje é ajudar a todos a viver essa confiança, que vem da fé.
- “A vossa perseverança salvará as vossas almas”!  Perseverar é dizer sempre “Sim”, mesmo quando a nossa vida parece um não constante ou um talvez!
- “Nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá”! É uma expressão idêntica a outra que diz que “os cabelos estão todos contados”! Significa que, na fé, sabemos que “tudo o que nos acontece cabe no amor infinito de Deus”.
- Lembra-nos a experiência de S. Paulo quando diz que “Deus concorre em tudo para o bem daqueles que O amam”!
- Só em Jesus encontraremos a firmeza sólida e a vitória da vida! A nossa cruz e o que perdemos aos olhos do mundo é transformado em Páscoa de ressurreição!

- QUE ATITUDES HOJE ?

Somos convidados a dar um testemunho de confiança e de perseverança, pela alegria de que Jesus Ressuscitado está connosco “até ao fim dos tempos”, qual divino “Companheiro de viagem”!

Pe. Cardoso

sábado, 2 de novembro de 2013

XXXI Dom. Comum - C

AS VISÕES DE ZAQUEU


1.VER DE CURIOSIDADE
- A curiosidade é um dos fatores de novas descobertas. O ser humano é curioso por natureza. Trata-se aqui de um ver natural, com os olhos.
- Por isso, Zaqueu subiu a um sicómoro, pensando: “Aqui vejo sem ser visto”!
- O sicómoro é uma árvore típica do Médio Oriente e Norte de África, com tronco largo e fraca ramagem. Parecido com a figueira, dá frutos de qualidade inferior!
- Zaque pensava: eu estou muito longe desse profeta, sou um grande pecador e, por isso, nunca poderei ser seu amigo, porém nada me há-de impedir de o ver bem! Quero saber se é alto, que trajes usa, enfim, qual é o aspeto!
- Até àquele dia, a vida de Zaqueu só dava frutos bravios, provocados pelo materialismo e pelo egoísmo... eram frutos mais fracos que os do sicómoro!
- Zaqueu “queria ver Jesus”. Porém, ele não tinha consciência de que essa curiosidade funcionava nele como uma abertura para a fé.

2. VER DE FÉ
- Ora, quando Zaqueu procura identificar Jesus no meio do grupo e finalmente O localiza, o seu olhar cruza-se com outro olhar que vinha já na sua direção, o olhar de Jesus. O Mestre até sabia o seu nome...
- Zaqueu ficou sem palavras e, por pouco não caía abaixo da árvore...
- Depois de tantos anos a ser marginalizado pelos chefes religiosos e pela sociedade por ser um pecador, sem qualquer possibilidade de salvação...
- O inesperado acontece. Jesus é o rosto de Deus que ama o pecador e toma a iniciativa... Jesus condena o pecado, mas ama o pecador para o libertar do pecado!
- Jesus não coloca condições, mas Zaqueu sente que tem de mudar, pois há algo dentro dele, a ação da graça que o impele a essa mudança.
- Zaqueu vive um verdadeiro encontro com o Senhor, encontro que transforma e que é uma nova luz na sua vida, a luz da fé. Esta é a segunda visão de Zaqueu.
- O Papa Francisco explica (nº 29 ss) que a fé une “a escuta da Palavra de Deus com o desejo de ver o seu rosto”, “é a luz de um Rosto, no qual se vê o Pai” (nº 30).

3.VER DE COMUNHÃO
- O Evangelho realça as palavras de Jesus, que confirmam que naquele dia (no “hoje” da história), a salvação entrou na casa de Zaqueu.
- A salvação entrou como uma centelha de uma nova luz, uma luz que brilhará totalmente apenas no futuro, depois da transformação da ressurreição.
- É a chamada “visão beatífica”, aquela visão feliz de Deus e em Deus, que significa a plenitude da realização humana, a sua maior felicidade, um bem inimaginável e apenas intuído pelo coração humano, que Deus oferece a todos!.
- “O ser humano está orientado à visão beatífica” (K.Rahner), a que somos chamados por Deus. Será uma visão de plena comunhão.
- “A fé encontra a sua maturidade com a passagem à visão beatífica(João Paulo II, Creo en el Spìritu Santo, 389). Esta é a terceira visão de Zaqueu e que esperamos também.


Como viver esta PALAVRA ? - “O cristão é aquele que se sente atraído pelo olhar do Senhor, se sente amado e salvo pelo Senhor até o fim” (Papa Francisco, homilia de 31 de Outubro último-2013). Saibamos deixar-nos atrair por esse olhar e viver a luz da fé, para participarmos um dia na luz da glória !!!

Pe. Cardoso